segunda-feira, 26 de junho de 2017

Multiplayer: porque não gosto (e um pouco sobre Star Wars: Battlefront)

Originalmente publicado em 29 de dezembro de 2015

Então, passei o Natal (e provavelmente passarei a virada do ano também) jogando Star Wars Battlefront (o desse ano, não o de 2004). Yeap, o hype me pegou, tirei fotinhas com sabres de luz na Comic Con, e aí fiquei com vontade de continuar nele. O filme é bem legalzinho, vai lá assistir.

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No entanto, quem me conhece um pouco sabe que geralmente respondo à pergunta “Você joga online?” com uma cara feia e um gesto de desdém (geralmente envolvendo um dedo do meio). Não sou tão radical assim de verdade, é só pra manter a fama de mau. De vez em quando, as estrelas se alinham de modo a fazer algum tipo de radiação cósmica cair em cima de mim e aí eu fico com vontade de matar uns trouxas em algum jogo de tiro online. Eu não jogaria League of Legends ou DOTA, não, jamais. É só radiação cósmica, não é o poder infinito de Cristo.

De fato, jogando Battlefront, eu fui me lembrando de todos os motivos pelos quais eu não gosto de nada online, e multiplayer pra mim se limita a ligar dois controles na mesma sala e jogar Mortal Kombat. E então, decidi que vou compartilhar esses motivos com todo mundo, para que a pergunta do “porque você não joga online” já tenha uma resposta complexa e bem pensada.

São cinco grandes motivos:
  1. Eu moro no Brasil
O Brasil é um país maravilhoso, onde o álcool flui, as pessoas passam o Natal na praia e a felicidade reina. Sarcasmos à parte, não é um país muito forte no que diz respeito a videogames. O mercado é forte, mas poucas são as empresas que possuem filiais aqui. A Nintendo recentemente anunciou que nem iria mais vender seus produtos aqui, e a única empresa que posso pensar no momento que tem um escritório local é a Blizzard.

battlefront2 Acredite, olhei MUITO tempo pra essa tela

Isso também quer dizer que os servidores para os jogos online são quase sempre localizados no exterior. Você pode conseguir encontrar partidas locais, que na maioria dos títulos não é muito fácil (e no caso do Battlefront, você nem tem opção de escolher isso, toda a seleção de servidores e partidas sendo feita automaticamente) ou você pode tentar entrar nos servidores norte-americanos e aguentar a arma que só atira dez minutos depois que você clicou o mouse. Sem contar com os maravilhosos serviços de Internet brasileiros, nos quais você paga uma grana violenta numa velocidade que seria abaixo do padrão em países como EUA ou Japão, e nem assim pode contar com que ela funcione corretamente ou em sua velocidade especificada.

E pra tentar achar partidas de jogos mais obscuros ou mais antigos? Boa sorte se quer achar uma partida multiplayer de Rage hoje em dia.
  1. Falta de tempo
Gosto de pensar que sou um crítico de games (cala a boca, eu sou sim!) e, por isso, gosto de jogar uma ampla variedade de títulos. De maneira geral, nós temos um grande lançamento a cada mês, mais ou menos, e considerando o tamanho dos jogos de hoje em dia, não é possível nem viável terminar todos eles com 100% das coisas feitas, quanto mais continuar participando de um modo multiplayer, que geralmente existe para que o cara não termine a campanha e só tenha oito horas de diversão. Ou seja, o modo multiplayer geralmente é uma adição que dá mais valor ao dinheiro gasto pelo consumidor. Feliz ou infelizmente, eu gosto de ir atrás de novos jogos, novas histórias, novos conceitos, e o modo multiplayer desses jogos nada mais é do que a mesma coisa repetida ad aeternum.

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Além disso, especialmente em jogos de tiro online, como Battlefront, você entra num jogo e é imediatamente morto duzentas vezes por algum jogador de level 50 que só joga Battlefront o dia todo por horas e já conhece todos os mapas como a palma da mão. Aliás, aqui é um bom lugar para falar sobre como jogos multiplayer assim são um perfeito exemplo para explicar o conceito de meritocracia e porque ele não funciona, se me permitirem uma divergência para um assunto político e polêmico.

Veja bem, o sistema de progressão de Battlefront funciona da seguinte forma. Conforme você joga, ganha pontos por ajudar a completar objetivos, como capturar pontos de controle, por desafios como matar dez jogadores com uma X-Wing, ou por cada outro jogador que você mata. Esses pontos, por sua vez, são convertidos em pontos de experiência, que aumentam seu ranking, e créditos, que permitem que você compre cartas que abrem itens diferentes, como foguetes teleguiados, tipos diferentes de granada, escudos temporários, etc.

Claro que, quanto mais você mata outros jogadores, mais pontos e mais créditos você ganha. Parece fazer sentido, certo? Quanto melhor você for no jogo, mais recompensas você tem. Só que a consequência é que o jogador novo é, conforme já estabelecido, transformado em saco de pancada pelos caras que já jogam esse tipo de jogo o tempo inteiro, não só porque não sabem jogar tão bem, mas também porque todo o equipamento bom está na mão deles. O jogador novo joga menos, pois passa mais tempo vendo esta tela:

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E esta tela:

99% rebelde, mas aquele 1% é Stormtrooper 99% rebelde, mas aquele 1% é Stormtrooper

E talvez mais um pouquinho desta:

Pelo menos a criatividade pra nomes de usuário não tem limite Pelo menos a criatividade pra nomes de usuário não tem limite

Menos tempo, menos equipamento, menos experiência, tudo leva ao cara simplesmente desistir do jogo. Dá pra entender agora porque a tal meritocracia não funciona? Eventualmente os únicos que jogam são aqueles que são bons e chegaram no level 50 em uma semana. E eu tenho mais o que fazer.
  1. Não há mais nada a se ver
As pessoas jogam videogames por muitos e variados motivos. Alguns querem provar para os amigos que são bons, outros querem encontrar todos os segredos, outros ainda gostam do aspecto social. Alguns gostam de ter a experiência de participar em uma história com começo, meio e fim. Eu estou nesta última categoria.

Mesmo quando eu participo de algo online, como por exemplo quando eu jogava muito Starcraft II, eu estabeleci uma meta, que era chegar na liga Diamante. Cheguei e imediatamente perdi todo o interesse. Eu preciso ver as coisas chegarem a uma conclusão, e não entendo como as pessoas podem ficar jogando Diablo III até o level 200 e lá vai pau, ou jogando Counter-Strike pra sempre. O jogo não muda nunca e você nunca vence e ele nunca para, e pra mim isso é desperdício de um tempo que eu poderia estar gastando descobrindo outro mundo no próximo jogo da pilha.
  1. O single-player precisa se manter sozinho
Pense em algo como Half-Life ou Half-Life 2. Esses são jogos que são considerados, tanto pelo público quanto pela crítica, como obras-primas do gênero. Ambos têm campanhas que revolucionaram os jogos de tiro, e até hoje resistiram ao teste do tempo. Ambos também possuem um modo multiplayer, mas ele é apenas isso, um algo a mais para quem não quer simplesmente jogar a campanha de novo e que quer fazer valer o seu dinheiro, e é mais do que justo.

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No entanto, Battlefront (e outros jogos como Quake 3 Arena e Unreal Tournament) fazem parte daquele estranho nicho que é exclusivamente multiplayer. Ah, claro, Battlefront vai tentar te convencer que tem um modo single-player, mas esse modo consiste nos mesmos mapas do modo multiplayer populados por bots ao invés de outras pessoas, o que derrota mais ainda o propósito.
Fora isso, outras pessoas e conexões de Internet são duas coisas que não são muito confiáveis. A Internet brasileira é cara e lenta, e nem sempre funciona como deveria. No dia 24 mesmo, não consegui jogar uma partida inteira, fiquei sendo desconectado em todas as partidas. E se você tentar reunir seus amigos pra jogar, precisa que todo mundo tenha o mesmo tempo livre e corre o risco de todo mundo votar em jogar Mortal Kombat e aí acabou a alegria (ou não).

Por isso, games PRECISAM ter um modo single-player, porque se você quer mesmo entrar de cabeça em um jogo, é como ler um livro: a única pessoa que pode fazer isso é você mesmo. O que me leva ao último e mais importante ponto:
  1. Pessoas são uma merda
Em 2004, o site de webcomics Penny Arcade publicou um quadrinho chamado “Green Blackboards (And Other Anomalies), que possuía este desenho, descrevendo a que eles chamavam de “Greater Internet Fuckwad Theory”:

Traduzido, é mais ou menos como "A Teoria do Grande Idiota da Internet": pessoa normal + anonimato + audiência = completo idiota Traduzido, é mais ou menos como "A Teoria do Grande Idiota da Internet": pessoa normal + anonimato + audiência = completo idiota

Esta tirinha estava descrevendo o comportamento das pessoas no então recém-lançado Unreal Tournament, porém, ela pode se aplicar a todos os cantos da Internet e à condição humana como um todo. Esses jogos online providenciam todas as três coisas descritas: pessoas normais + anonimato + audiência, e isso faz deles o viés perfeito para todo e qualquer tipo de comportamento tóxico. Jogue uma partida de Call of Duty online e te pagarei uma cerveja se não aparecer algum moleque xingando sua mãe, pra ser o mais otimista possível. Por isso, eu procuro evitar qualquer multiplayer no qual os outros jogadores não estão ao alcance dos meus punhos e, portanto, estão presos às leis da etiqueta social.

Alguém pode me responder que esse é o objetivo de se jogar num ambiente multiplayer, a socialização. No entanto, Battlefront é diferente nisto também: não há interação entre jogadores que não seja tiro, porrada ou bomba. De fato, eu já estava no level 20 quando percebi que apertando a tecla Y você abria um chat. E mesmo depois de descobrir, o chat nunca era usado. Então, efetivamente, ninguém interage entre si. São quarenta estranhos dentro de um mesmo jogo cuja única interação é a violência virtual, e ninguém vai se conhecer, sair pra tomar uma breja depois. É como jogar single-player, só que sem história, sem contexto e sem interação verdadeira.

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Então, por tudo isto, eu não gosto de jogos multiplayer. Não estou dizendo com este texto que não me diverti nem um pouco com Star Wars Battlefront, de fato, eu ainda estou jogando nas pausas em que paro de escrever este texto. Mas é uma diversão rasa e vazia. É como assistir a um filme do Michael Bay, no qual as explosões vão te distrair por alguns segundos, mas quando você para pra pensar, vê que não tem conteúdo, e que está fazendo mais pelo prazer de ver a barrinha de experiência aumentar do que pela riqueza da experiência.

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