segunda-feira, 26 de junho de 2017

Tomb Raider (2013)

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Originalmente publicado em 5 de abril de 2013

Ciclos. Uma rápida busca no Google me mostra que um zilhão de ciclos fazem parte da nossa vida, desde a biologia celular, passando pela história, até os pensamentos filosóficos. O Wikipédia me mostra uma dúzia de ciclos de combustão explicados pela física, por exemplo. Os games também têm seus ciclos.

Ao fim de mais uma geração de consoles, que logo se iniciará novamente com o Playstation 4, mais uma franquia que um dia foi famosa é revivida com uma nova origem em uma nova aventura, afim de conquistar novos fãs. Só que ela continua um ciclo que não me agrada tanto assim: Uncharted um dia foi inspirado por Tomb Raider, e agora Tomb Raider copia a fórmula de Uncharted para ser melhor sucedido.

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Mas vão me perguntar: “Porra, Renato, porque isso não te agrada? Uncharted é espetacular, tem as melhores cenas de ação dessa geração!”. Bom, lhe explicarei: um game não é só feito de cenas de ação espetaculares, mas também de uma pequena coisa chamada “interatividade”. É básico, um game precisa ser interativo, de outra forma ele podia ser apenas um filme blockbuster. E o pecado desse novo Tomb Raider está bem aí: ele é tão desesperado em sua tentativa de ser uma experiência cinematográfica que esquece de ser um game em primeiro lugar.

Ainda por cima, o marketing está totalmente errado. Foi prometida uma aventura realista onde Lara Croft, agora novamente uma menininha indefesa, teria que aprender a se virar para sobreviver num ambiente hostil. Mas se você se segurar à palavra “realista”, vai se decepcionar. Nos primeiros 15 minutos de jogo, Lara quase se afoga, toma uma porrada na cabeça, é pendurada de cabeça pra baixo, pega fogo e cai em cima de um pedaço de ferro que atravessa a barriga dela. E claro que ela sai andando na boa depois disso, porque a jogabilidade dita que ela não pode ficar incapacitada.

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Essas discrepâncias entre a tentativa de ser cinema e a jogabilidade acontecem durante o jogo inteiro. Em um momento, você precisa caçar algum animal pra comer com seu arco e flecha. Isso parece querer introduzir uma mecânica de sobrevivência em que você precisa comer de vez em quando para continuar de pé e tal, mas na verdade você só precisa caçar nesse momento e depois nunca mais precisa atirar em um animal no resto do jogo. A primeira vez que você precisa passar por cima de um tronco de árvore em um precipício, há todo um drama e você acha que tem uma mecânica pra evitar cair do tronco puxando as setas pros lados, mas é só andar pra frente que a animação dela se completa sozinha. E a pior de todas: uma cena enorme de Lara se ajoelhando e gritando “Ó Deus!” ao ser obrigada a matar o primeiro cara, seguida de você tomando controle e matando pelo menos uns dez caras antes mesmo de ir para outra área do mapa, sem ao menos piscar.

Essas tentativas de ser sério e cinematográfico acabam por minar a jogabilidade em todos os aspectos. Aprecio as dezenas de colecionáveis que são colocados em cada mapa para encorajar a exploração, mas indo atrás deles, é mais fácil ainda de quebrar a narrativa. Lara diz numa cutscene: “Preciso encontrar tal sobrevivente rápido!” e logo depois você vai subir num telhado procurando estátuas para colocar fogo ou corpos pendurados em cruzes para derrubar. Onde está o contexto? Porque Lara precisa colecionar essas coisas? Porquê ela pode adiar o resgate de seus amigos pra ir atrás dessas coisinhas?

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Por outro lado, a história do game em si é a única coisa que ainda é padrão Tomb Raider. Lara e amigos se perdem numa ilha no Japão, ilha esta que se encontra no meio de um círculo de tempestades. Logo descobre-se que essas tempestades magicamente aparecem em cima de qualquer veículo, marinho ou aéreo, que tente se aproximar ou escapar da ilha. Ao mesmo tempo, um culto bizarro sequestra uma amiga de Lara, e você precisará resgatá-la, além de descobrir qual é a das tempestades, numa mistura bem Indiana Jones de sobrenatural e aventura. Porém, não ajuda que cada um dos personagens é um clichê ambulante, e você vai saber o destino de cada um deles só pelas suas atitudes (o fuinha é traíra, o nerdzinho é apaixonado pela Lara, etc.)

Quanto à jogabilidade, temos vários aspectos, mas todos eles são rasos. As seções de plataforma são as mais satisfatórias, pois Lara possui animações muito bem feitas e seus controles são precisos. Porém, mesmo na parte mais legal, você ainda vai perceber que muita coisa está fora de seu controle, como consequência da direção cinematográfica. Você não pode controlar quando Lara anda ou se agacha, por exemplo. Ela faz isso automaticamente dependendo do contexto, e isso ajuda na sensação de que você nunca está realmente a controlando.

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Essas partes de plataforma são quebradas por sequências de ação ditadas por “quick-time events”, sim, aquelas mesmas que eu odeio com todas as forças. Tomb Raider tem dezenas delas espalhadas em toda sua duração, e elas são particularmente irritantes, e a maior causa de mortes durante o jogo. Algumas das piores envolvem se mover apenas quando o jogo quer que você se mova, caso contrário é morte instantânea, e o controle é tomado de você tantas vezes durante a sequência que fica difícil de julgar quando você precisa controlar Lara ou quando ela está se controlando sozinha, o que é muito frustrante.

Quando não é plataforma ou sequência de ação, é tiro em terceira pessoa. Você tem algumas armas à sua disposição, mas são apenas os padrões chatos de Uncharted: fuzil de assalto, pistola, escopeta e o arco (sério, desenvolvedores, qual é a do arco nos jogos atuais?). Nada de armas de arpões, ou mesmo de usar duas pistolas como nos antigos games. Os tiroteios são funcionais, mas novamente, Lara entra em cobertura automaticamente e regenera vida tão rápido que é impossível morrer. Falta de variedade em inimigos também dificulta a aceitação. Matar inimigos também dá a Lara pontos de experiência que podem ser gastos em novos movimentos que matam inimigos instantaneamente e recursos que podem ser usados para fazer upgrades nas armas. Os upgrades são imperceptíveis no uso geral das armas, e os auto-kills servem pra deixar o jogo ainda mais fácil.

Talvez a inclusão de “tumbas” seja a parte mais terrível. Já que o game se chama Tomb Raider, precisava ter umas tumbas pra roubar, certo? Infelizmente, essas tumbas mais parecem uma esmola dos desenvolvedores para tentar comprar os fãs dos games antigos, e consistem apenas de enigmas físicos que são tão simples que chegam a ser insultantes.

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Bom... pelo menos é um jogo bonito de se assistir. Não é tecnicamente impressionante como Crysis 3, mas ainda é um game de fim de geração, e em sua versão de PC tem todos os efeitos de DirectX 11 que fazem nerds como eu comprarem placas de vídeo monstruosas. Computadores especialmente poderosos podem aproveitar do novo efeito de cabelo dinâmico, TressFX, que faz Lara ter fios de cabelo individuais que se movimentam com vento, água e são realisticamente animados. Sinceramente... é um efeito que pode vir a ficar legal, mas não está legal aqui. Ele come boa parte da taxa de frames, especialmente em placas Nvidia (é um efeito otimizado para AMD) e quando o jogo dá close em Lara nas cutscenes, chegando até a 10 FPS na minha GTX 580. E o efeito tende a dar pau, muitas vezes fazendo o cabelo de Lara se mexer e pular sozinho como se ela fosse a Medusa. Também vale lembrar que o mesmo efeito foi alcançado pelo Alice: Madness Returns em 2009 apenas com a Unreal Engine 3, sem nenhum problema de performance. De qualquer forma, a opção está aí.

Por fim, é triste. Eu era um fã de Tomb Raider antigo, e é com pesares que dou adeus à velha Lara Croft. Ainda assim, a esperança é a última que morre. Fica aqui o desejo de que aprendam com os erros deste game para que os próximos retomem uma parte do que a franquia já foi um dia.

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